sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

"A obra ao Negro"...ou as saudades de Isabella

Aqui começámos a delirar...Não sei quem é a Yourcenar -disse ela. Pertenço a uma geração que já não lê francês... A minha sócia tem alguma razão. Estamos a assistir a um novo paradigma cultural neste início do século XXI. A vitória dos Obamas Bin Socrates.

A literatura portuguesa começou a guinar depois de 1978, ano em que morreu Jorge de Sena e Ruy Belo. Alguns alunos da Faculdade de Letras de Lisboa convocavam para o bar uma conferência com o falecido há umas semanas nos Estados Unidos...mas que mesmo assim teve público! Nesse ano foram publicadas pelaa primeira vez as obras completas do António Maria Lisboa e redescobriamos "a Intrevenção Surrealista" com um lag de 30 anos.

O Carlos de Oliveira (sim... o da "Abelha na chuva "daquele filme horrível do Fernando Lopes) publicava então o "Finisterra". O Saramago ainda não tinha tinha publicado os "Levantados do chão" mas estava fechado o trajecto oficial do Neo-realismo em Portugal.

O Eduardo Lourenço iniciava com "o Labirinto da Saudade" a psicanálise mítica do povo português.

O Francês tinha deixado de ser a primeira língua estrangeira obrigatória no sistema de ensino em Portugal.

Pertenço a uma geração ainda marcada pela palavra de ordem "sur le pavé la plage", primeira língua que aprendi na escola (o inglês era débil..e resumia-se a umas canções...she loves me , o alemão mínimo...meine liebe Anette...e o castelhano inexistente...mira guapa que és muy preciosa...) não entendo este anti-francesismo actual que olha o umbigo e se crê no centro da modernidade. A França representou para mim o encontro, a assimilação e a diversidade...uma cultura francófona que ultrapassava largamente as dimensões do hexágono gaulês. Há autores cuja notoriedade passou por escreverem em francês, de Kundera a Tahar Ben Jelloun...como ainda recentemente com o americano Jonathan Littell que escreveu "As benevolentes" na língua de Voltaire.

A Hopes alegando falta de tempo passou-me a bola... Moderas tu..não foi afinal outro dos livros da tua vida? Pas de problem Komrad! Se houve livros que li mais que duas vezes na vida... um deles foi as "Memórias de Adriano" revelada tardiamente por um amigo especial.
Uma noite sózinho em Bruxelas... e não parava de chover... toca o telefone.
- Olá..lembraste de mim? Encontrámo-nos na praia este Verão. Sou primo do... Queres vir beber um copo a minha casa? Já tentei subir as paredes...já me tentei atirar do quarto andar ..mas tenho medo...estou muito sózinho. Começou aqui outra nova amizade do Corto Maltese e a descoberta da Marguerite Yourcenar.

Mas um dia vou voltar para fazer de novo o elogio da bela Marguerite Yourcenar que era belga como o Brel, do Godard que era suíço, da Isabelle Adjani e da Carla Brunni que como toda a gente sabe são francesas.

Mas para quem quiser mesmo conhecer “A obra ao negro”, de Marguerite Yourcenar, fica aqui um resumo bem feito, por Luís Miguel Queiroz.

"O percurso de Zenão, no pano de fundo da Europa da primeira metade do século XVI. Uma obra-prima em nada inferior a “Memórias de Adriano”, o romance que celebrizou Yourcenar.
Poucos dias antes de rebentar, em Paris, o movimento de contestação estudantil de Maio de 1968, aparecia nas livrarias francesas um livro intitulado “A Obra ao Negro”. No meio de uma tal agitação, que tomava as ruas e monopolizava os “media”, parecia haver bons motivos para duvidar do êxito de um romance de fundo histórico, cuja acção, narrada numa escrita exigente e quase anacronicamente “clássica”, decorria no distante século XVI.
A própria autora, Marguerite Yourcenar, numa carta dirigida, em 1964, ao editor Gaston Gallimard, confessava-se apreensiva: “Pensei escrever as ‘Memórias de Adriano’ para dez pessoas, e enganei-me. Creio neste momento terminar ‘A Obra ao Negro’ para dez pessoas e é muito possível que não me engane.”
Na verdade, voltou a enganar- se. Em apenas dois meses, a Gallimard esgotou duas tiragens, num total de 40 mil exemplares. Os críticos, descontadas raríssimas excepções, não lhe pouparam elogios. Muitos falaram de “obra-prima”. Apenas um ou outro se lamentou de “falta de calor”. O que talvez possa ser lido como um involuntário elogio, já que é justamente pela sua deliberada e impiedosa rasura de todo o sentimentalismo que este livro consegue emocionar tão profundamente os seus leitores.
Constituindo um espantoso fresco da Europa do século XVI — das intrigas políticas às querelas religiosas, da filosofia à vida quotidiana, da cultura literária às discussões científicas —, “A Obra ao Negro” é também a história pessoal de Zenão, o filho bastardo de um grande negociante de Bruges, cujo pai, que não chega a reconhecê-lo, era ainda aparentado com a poderosa família dos Médicis.
Médico, filósofo e alquimista, podem ver-se na vida de Zenão, embora o romance não o assuma expressamente, as etapas da Grande Obra alquímica, com os seus momentos de decantação, dissipação e sublimação. O objectivo da alquimia, reclama a tradição, era o de transformar o próprio alquimista. A transmutação dos metais constituía apenas o seu fito aparente, a face visível de uma operação interior. Logo no primeiro capítulo deste romance, sintomaticamente intitulado “O Longo Caminho”, Zenão despedese de um primo, dizendo-lhe: “Há alguém à minha espera. Vou até lá.” Pergunta o interlocutor: “Quem é?” E Zenão responde: “Hic Zeno. Eu mesmo.”
No entanto, desenganem-se os fãs de Paulo Coelho, este não é um desses romances que pisca o olho aos fascinados pelo oculto. Zenão, sem deixar de ser o produto complexo do século em que vive, prefere investigar “os movimentos diastólicos e sistólicos do coração”, do que perder o seu tempo a discutir os atributos de Deus ou a procurar uma saída no labirinto alegórico dos filósofos alquímicos.
O pintor e cientista visionário Leonardo Da Vinci, o cirurgião Ambroise Paré, o anatomista Vesálio, o médico e alquimista Paracelso e, talvez mais do que todos, Erasmo de Roterdão, são algumas das figuras históricas com as quais poderemos ser tentados a identificar Zenão.
Num apêndice que redigiu para o livro, Yourcenar admite estas e outras influências, mas alerta que não pretendeu “compor mecanicamente uma personagem sintética, coisa que nenhum romancista consciencioso aceita fazer”. De facto, poucas personagens na história da literatura conseguem ser tão “reais” como Zenão.
Se quisermos resumir este livro, o melhor ainda será citar a própria Yourcenar, na já referida carta a Gallimard: “Trata-se da vida movimentada, mas também meditativa, de um homem que faz total tábua rasa das ideias e preconceitos do seu século para ver depois onde o seu pensamento o conduzirá livremente.”

A Kua que tinha proposto este livro para discussão não apareceu. Mas temos fotos para mostrara que a sessão na Academia Portucalis que nos recebeu..estava cheia de leitores!

1 comentário:

  1. LI o Livro, sinceramente não sei dizer a que veio, achei dificil, cada capitulo me pareceu uma história a parte, que nada ligava a lugar algum.Ganhei o livro de uma amiga e vou doa-lo a bibliotece, não sei se alguém vai ler, talvez algum intelectual.

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