sábado, 31 de janeiro de 2009

Boa noite Sr. Soares: o momento da verdade

.
A tarefa não se adivinhava fácil. Gerar um debate interessante em torno da misteriosa figura do Sr. Soares? Caramba! Chega-se ao fim do livro sem conhecer de facto o Sr. Soares, vamos falar de quê? Dos heterónimos de Fernando Pessoa, quando a maioria das pessoas tem péssimas recordações dessas aulas de português. A culpa não será do Pessoa, mas debates literários e teóricos não devem fazer uma discussão muito animada, quando se quer um grupo de leitura informal...

Pronto, estava oficialmente preocupada. Felizmente estava enganada. É que o Sr. Soares estava rodeado de personagens tão interessantes, que depressa se gerou uma enorme conversa em torno dos defeitos e feitios destas figuras que desfilavam ao lado do protagonista. Desde o senhor que adorava comer, ao sonhador-viajante que era o António, à sua família, da pobre da irmã ao intragável cunhado, do primo brasileiro pé-descalço armado em ricaço e à sobrinha que só com cinco anos, revela um humor negro extraordinário; todos foram tema de conversa que deu pano para mangas. E aquela Lisboa onde viviam, tão bem caracterizada pelo autor, fez-nos imaginar a caminhar pela rua dos Douradores e a espreitar para o escritório do Sr. Soares. Lá estava o calendário da Senhora do decote com os seus lábios vermelhos e o barquinho de papel que ele fez para o António…

Ainda houve tempo para discutir qual dos Heterónimos do Pessoa, era mais normal, sem claro, conseguirmos chegar a conclusão alguma… Assim nos despedimos do enigmático Sr. Soares e passamos a discutir o senhor que se segue. Venha o “Estranho numa terra estranha”!

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Um convite literário

Não posso dizer que não me surpreendeu. Primeiro, porque já fui muito mais devoradora de livros do que sou hoje. Depois, por ter confessado a um dos fundadores que não tinha lido os últimos livros dos encontros...Bem, confesso. Consegui não ler nenhum dos livros dos encontros City Lights. Gosto de lá estar a ouvir...mas raramente participo. E acrescento alguns livros na lista.
Mas sei que ainda não perderam a esperança por mim: os conselhos da linda Poulana ajudaram, e agora o convite que me fizeram para participar neste blog (e que muito agradeço) foi sem dúvida mais uma tentativa de me faze ver (novamente) a luz da literacia.

Por isso agradeço imenso ao Fokas e à Hopes o convite, prometo que vou (tentar) me portar bem e espero que dê frutos esta parceria literária.

E sem me querer alongar muito porque este post tem de ser, no mínimo produtivo, vamos ao que interessa.

Bem sei que os temas e livros debatidos até agora são muitos, e outros tantos os propostos. Por isso o meu desafio é outro. Sem querer ligar a grandes génios da literatura, a grandes autores conhecidos, a eternos autores e grandes obras. Que tal dizer aqui somente os 3 últimos livros que pegaram, com vontade de ler? Atenção que não vale folhear um livro na livraria. Também não valem revistas. Tio Patinhas, Tintim ou Lucky Luke pode ser. São livros de banda desenhada mas são livros :P

Quanto aos meus...pois tenho de pensar um bocadinho. Ultimamente uma série de sugestões fizeram com que começasse a ter uns quantos à cabeceira. Resta saber quais vou acabar de ler primeiro ;)...

Obrigado de novo Hopes e Fokas. Muitos parabéns pelo City Lights...

e boas leituras a todos!

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Um Estranho numa Terra Estranha

Um Ser Humano criado por marcianos retorna à Terra no inicio da idade adulta, para se deparar com costumes, valores e situações sociais que lhe são estranhas.
Para além de ser um excelente argumento de um filme rasca de ficção cientifica, este livro é também um dos clássicos da ficção cientifica, e empresta-nos a objectividade possivel para a análise de uma sociedade em mudança, no início dos anos 60.
Em contraste com as sociedades imaginadas de Huxley e Orwell, Heinlein traz-nos uma análise da sociedade em que viveu por um ser imaginado. Uma fantasia cientifico-hippie cheia de clichets e lamechices. Atrevem-se?

domingo, 25 de janeiro de 2009

Boa noite, Sr. Soares - um resumo


Na véspera de mais um encontro City Lights, fica um resumo do "Boa Noite, Sr. Soares":


«Mário Cláudio escolheu para personagens alguns nomes que surgem no Livro do Desassossego, e passo a citar: «Se houvesse de inscrever […] a que influências literárias estava grata a formação do meu espírito, abriria o espaço ponteado com o nome de Cesário Verde, mas não o fecharia sem nele inscrever os nomes do patrão Vasques, do guarda-livros Moreira, do Vieira caixeiro de praça e do António moço do escritório.»

Para narrador da história Mário Cláudio escolheu o moço do escritório, António, talvez por ser o mais novo, o mais ingénuo e por isso mais capaz de ser tocado por aquele ser estranho com quem convive à distância no escritório do patrão Vasques.

Em Boa Noite, Senhor Soares recebe um nome completo — António da Silva Felício — e é um jovem acabado de chegar da província, mais precisamente de Escalos de Cima, concelho de Idanha a Nova, para se empregar como aprendiz de caixeiro no escritório de um armazém de venda a retalho da baixa lisboeta, na prosaica Rua dos Douradores, onde o senhor Soares é tradutor.

Com a simplicidade própria de quem nada conhece, António tudo e todos observa com atenção. E limita-se a descrever o que presencia, como se o fizesse quase apenas para si próprio, sem emitir juízos. Desde o primeiro momento que o rapaz fica preso à figura do Senhor Soares que, segundo diziam os seus colegas, «embora não se distinga de qualquer outro sujeito, a verdade é que deu sempre mostras de ser um bocadinho esquisito»

No escritório todos sabem que escreve e que é poeta, e sem que António compreenda bem porquê, o certo é que goza de um estatuto especial. Incluindo para o patrão Vasques e para o guarda-livros, o senhor Moreira, que teoricamente ocupa o lugar de chefe do tradutor, mas aceita de bom grado a alcunha de Dom Barómetro que o senhor Soares lhe atribuiu devido à constante preocupação do guarda-livros com as condições atmosféricas.

Ao inserir-se no seu pequeno círculo de relações, António relata pormenores da vida de cada um, sobretudo aqueles que se vão tornando motivo de conversa dos outros. E desenrola perante o leitor um tecido urbano pardo, onde tudo remete para uma Lisboa murcha e tristonha, fechada sobre si mesma, onde nada acontece, nada é dramático, nem exaltante. Uma Lisboa onde o tempo não corre e, cito, «o dia seguinte seria de trabalho, igual aos da semana anterior, e da próxima» (p. 31), e em que uma mediocritas nada áurea todos invade. Todos não. Um ser escapa, um ser especial, que suscita a curiosidade do rapaz, por motivos que ele próprio não entende.

E à medida que avançamos na leitura, a fantástica mestria de Mário Cláudio vai-nos permitir (a nós, seus leitores) apreciar o modo como o rapaz se deixa tocar pela personalidade daquele enigmático senhor Soares. O leitor só tem acesso ao discurso interior do rapaz, que revela a sua total candura, a dificuldade em interpretar a sua própria experiência e os sonhos de viagens que não fará.

Gradualmente, a figura do Senhor Soares transforma-se no principal foco da atenção do jovem António e aquele adulto com quem nunca conversa, aquele senhor que só à saída dirige a palavra ao colectivo rapazes do escritório para lhes dar as boas noites, vai ser a figura de referência da sua juventude privada de projectos, de perspectivas e de formação.

(...) De repente, vira-se a página e passaram 52 anos. António recorda vagamente a cidade, o seu antigo local de trabalho, os sons que já não se ouvem… mas o que evoca com mais nitidez é o Senhor Soares, que tão mal conhecera e que afinal tanto o marcara. A sua vida é um arco entre a juventude e a velhice. Como na epígrafe de Shelley que abre o livro: «Youth will stand foremost ever» («A juventude permanecerá para sempre, acima de tudo»).»


Emílio Rui Vilar, publicado em 9.9.2008 na secção Recensões Críticas. Mário Cláudio — Boa Noite, Senhor Soares. Lisboa: Dom Quixote, 2008.

Entrevista a F. Pessoa

Palavras ditas por Mário Viegas

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Boa Noite, Senhor Soares


"A minha maior surpresa aconteceu porém numa tarde em que estávamos apenas os dois no escritório, e o Senhor Soares saiu sem uma palavra, deixando-me sobre a secretária uma barquinho de almaço pautado, e com este nome no casco, desenhado a lápis, António.

("Boa Noite, Senhor Soares", Mário Cláudio, 2008).

"Absurdo

Tornarmo-nos esfinges, ainda que falsas, até chegarmos ao ponto de já não sabermos quem somos. Porque, de resto, nós o que somos é esfinges falsas faloas e não sabemos o que somos realmente. O único modo de estarmos de acordo com a vida é estarmos em desacordo com nós próprios. O Absurdo é o divino."

("Livro do Desassossego", Bernardo Soares).

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Numa cegueira branca...

.
Diria que foi o momento alto do City Lights, a discussão em torno do "Ensaio sobre a Cegueira" de José Saramago. Não só o debate ultrapassou a temática do livro, saltou para as nossas vidas e para a debilidade da nossa condição. Para além de uma conversa deliciosa, tiramos o máximo partido do SL e conseguimos recriar uma cegueira branca, com o precioso contributo do Imso, da Elora e da Poulana. Foi uma surpresa agradável para todos.

Um livro sobre a condição humana trazia forçosamente pano para mangas. Era inevitável questionar se a falta de ética e a desumanidade que começa a grassar entre os cegos, se devia apenas à catástrofe que se abateu sobre eles e à necessidade de sobreviver. Cada um de nós questionou o que faria para sobreviver, quais os nossos limites, o que seríamos capazes de sacrificar. Falou-se de dignidade e de impunidade. As escolhas das personagens foram criticadas por uns e elogiadas por outros.

Como o Narrador do livro, fomos juízes, advogados do diabo, desculpámos, julgámos e explorámos a consciência moral das personagens. Se o drama das personagens nos tocou, também nos emocionou a fragilidade do que damos por adquirido. E da condição humana, impressiona-nos o facto do gesto de maior compaixão no livro vir de um cão e não de um ser humano... Acho que todos exploramos os recantos da nossa alma, naquele dia, os nossos pontos fortes e as nossas fraquezas. Através de um livro e de uma boa conversa, ficou mais claro para todos o que é isso de ser humano...


Capitu Musica tema

Não é só ler o Dom Casmurro.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Capitu


"Saber ler e escrever, vestir casaco e gravata, ter estudado e vivido na cidade, já nada serve. Só os bruxos são capazes de perceber o que se passa" Mário Vargas Llhosa (Lituma nos Andes).


Mas posso escrever um post por exemplo: " A noite está estrelada e fria e nos teus olhos verdes, tiritam os astros lá ao longe." Posso até tentar escrever versos tristes esta noite: "Pensar que não a tenho. Sentir que a perdi já. Importa-me lá que o meu amor não a podesse guardá-la. A noite está estrelada e ela não está comigo mais.
Como aficionado ainda podia escrever outras frases, umas linhas de despedida para a Marcia, dignas de um aficionado, de um aficionado da loucura. "Vou-me embora, querida, porque noto que envelheço e não posso suportá-lo. Além disso acho que estou acabado e as minhas depressões acentuaram-se muito ultimamente". (fingo que não vejo as mulheres que passam, mas vejo...é tudo mentira).

Mas se não tivesse ido lá... a Marcia não me deixaria voltar a casa. Depois de tantos anos, ali estava no mesmo local, desta vez ao som do Bob Dylan.
- Estás aqui há muito? Há uns sete meses...respondi-lhe mas durante esse tempo numa livraria...descobrem-se muitas coisas. Estava à espera que viesses.
- Como é ele o Senhor F. ( o dono)? Ele vem à loja de vez em quando?
- Normalmente vem todos os dias - respondi-lhe. (Eu já sabia quem ela era... não devia ter mais do que 30 anos).
- Sou a Capitu. Ele escreveu-me e pediu-me para aparecer... Parece que vão ler no "City Lights" o Dom Casmurro na SL.

sábado, 10 de janeiro de 2009

Francesinhas


Teria sido mais simples se tivessem escolhido a Duras. "O Amor". Sim...esse eu li.... como devorei depois todos os outros livros dela. Sabes Fokas... quando fui para o Porto tinha 15 anos. Podiamos entrar em Belas Artes com essa idade. A idade dos sonhos...

Ou a Françoise Sagan...a minha mãe entre os livros de medicina tinha escondido o "Bonjour tristesse" com uma dedicatória enigmática que só entendi muitos anos depois . "Até ao fim do mundo"...Nazaré, Verão 1955.




sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

"A obra ao Negro"...ou as saudades de Isabella

Aqui começámos a delirar...Não sei quem é a Yourcenar -disse ela. Pertenço a uma geração que já não lê francês... A minha sócia tem alguma razão. Estamos a assistir a um novo paradigma cultural neste início do século XXI. A vitória dos Obamas Bin Socrates.

A literatura portuguesa começou a guinar depois de 1978, ano em que morreu Jorge de Sena e Ruy Belo. Alguns alunos da Faculdade de Letras de Lisboa convocavam para o bar uma conferência com o falecido há umas semanas nos Estados Unidos...mas que mesmo assim teve público! Nesse ano foram publicadas pelaa primeira vez as obras completas do António Maria Lisboa e redescobriamos "a Intrevenção Surrealista" com um lag de 30 anos.

O Carlos de Oliveira (sim... o da "Abelha na chuva "daquele filme horrível do Fernando Lopes) publicava então o "Finisterra". O Saramago ainda não tinha tinha publicado os "Levantados do chão" mas estava fechado o trajecto oficial do Neo-realismo em Portugal.

O Eduardo Lourenço iniciava com "o Labirinto da Saudade" a psicanálise mítica do povo português.

O Francês tinha deixado de ser a primeira língua estrangeira obrigatória no sistema de ensino em Portugal.

Pertenço a uma geração ainda marcada pela palavra de ordem "sur le pavé la plage", primeira língua que aprendi na escola (o inglês era débil..e resumia-se a umas canções...she loves me , o alemão mínimo...meine liebe Anette...e o castelhano inexistente...mira guapa que és muy preciosa...) não entendo este anti-francesismo actual que olha o umbigo e se crê no centro da modernidade. A França representou para mim o encontro, a assimilação e a diversidade...uma cultura francófona que ultrapassava largamente as dimensões do hexágono gaulês. Há autores cuja notoriedade passou por escreverem em francês, de Kundera a Tahar Ben Jelloun...como ainda recentemente com o americano Jonathan Littell que escreveu "As benevolentes" na língua de Voltaire.

A Hopes alegando falta de tempo passou-me a bola... Moderas tu..não foi afinal outro dos livros da tua vida? Pas de problem Komrad! Se houve livros que li mais que duas vezes na vida... um deles foi as "Memórias de Adriano" revelada tardiamente por um amigo especial.
Uma noite sózinho em Bruxelas... e não parava de chover... toca o telefone.
- Olá..lembraste de mim? Encontrámo-nos na praia este Verão. Sou primo do... Queres vir beber um copo a minha casa? Já tentei subir as paredes...já me tentei atirar do quarto andar ..mas tenho medo...estou muito sózinho. Começou aqui outra nova amizade do Corto Maltese e a descoberta da Marguerite Yourcenar.

Mas um dia vou voltar para fazer de novo o elogio da bela Marguerite Yourcenar que era belga como o Brel, do Godard que era suíço, da Isabelle Adjani e da Carla Brunni que como toda a gente sabe são francesas.

Mas para quem quiser mesmo conhecer “A obra ao negro”, de Marguerite Yourcenar, fica aqui um resumo bem feito, por Luís Miguel Queiroz.

"O percurso de Zenão, no pano de fundo da Europa da primeira metade do século XVI. Uma obra-prima em nada inferior a “Memórias de Adriano”, o romance que celebrizou Yourcenar.
Poucos dias antes de rebentar, em Paris, o movimento de contestação estudantil de Maio de 1968, aparecia nas livrarias francesas um livro intitulado “A Obra ao Negro”. No meio de uma tal agitação, que tomava as ruas e monopolizava os “media”, parecia haver bons motivos para duvidar do êxito de um romance de fundo histórico, cuja acção, narrada numa escrita exigente e quase anacronicamente “clássica”, decorria no distante século XVI.
A própria autora, Marguerite Yourcenar, numa carta dirigida, em 1964, ao editor Gaston Gallimard, confessava-se apreensiva: “Pensei escrever as ‘Memórias de Adriano’ para dez pessoas, e enganei-me. Creio neste momento terminar ‘A Obra ao Negro’ para dez pessoas e é muito possível que não me engane.”
Na verdade, voltou a enganar- se. Em apenas dois meses, a Gallimard esgotou duas tiragens, num total de 40 mil exemplares. Os críticos, descontadas raríssimas excepções, não lhe pouparam elogios. Muitos falaram de “obra-prima”. Apenas um ou outro se lamentou de “falta de calor”. O que talvez possa ser lido como um involuntário elogio, já que é justamente pela sua deliberada e impiedosa rasura de todo o sentimentalismo que este livro consegue emocionar tão profundamente os seus leitores.
Constituindo um espantoso fresco da Europa do século XVI — das intrigas políticas às querelas religiosas, da filosofia à vida quotidiana, da cultura literária às discussões científicas —, “A Obra ao Negro” é também a história pessoal de Zenão, o filho bastardo de um grande negociante de Bruges, cujo pai, que não chega a reconhecê-lo, era ainda aparentado com a poderosa família dos Médicis.
Médico, filósofo e alquimista, podem ver-se na vida de Zenão, embora o romance não o assuma expressamente, as etapas da Grande Obra alquímica, com os seus momentos de decantação, dissipação e sublimação. O objectivo da alquimia, reclama a tradição, era o de transformar o próprio alquimista. A transmutação dos metais constituía apenas o seu fito aparente, a face visível de uma operação interior. Logo no primeiro capítulo deste romance, sintomaticamente intitulado “O Longo Caminho”, Zenão despedese de um primo, dizendo-lhe: “Há alguém à minha espera. Vou até lá.” Pergunta o interlocutor: “Quem é?” E Zenão responde: “Hic Zeno. Eu mesmo.”
No entanto, desenganem-se os fãs de Paulo Coelho, este não é um desses romances que pisca o olho aos fascinados pelo oculto. Zenão, sem deixar de ser o produto complexo do século em que vive, prefere investigar “os movimentos diastólicos e sistólicos do coração”, do que perder o seu tempo a discutir os atributos de Deus ou a procurar uma saída no labirinto alegórico dos filósofos alquímicos.
O pintor e cientista visionário Leonardo Da Vinci, o cirurgião Ambroise Paré, o anatomista Vesálio, o médico e alquimista Paracelso e, talvez mais do que todos, Erasmo de Roterdão, são algumas das figuras históricas com as quais poderemos ser tentados a identificar Zenão.
Num apêndice que redigiu para o livro, Yourcenar admite estas e outras influências, mas alerta que não pretendeu “compor mecanicamente uma personagem sintética, coisa que nenhum romancista consciencioso aceita fazer”. De facto, poucas personagens na história da literatura conseguem ser tão “reais” como Zenão.
Se quisermos resumir este livro, o melhor ainda será citar a própria Yourcenar, na já referida carta a Gallimard: “Trata-se da vida movimentada, mas também meditativa, de um homem que faz total tábua rasa das ideias e preconceitos do seu século para ver depois onde o seu pensamento o conduzirá livremente.”

A Kua que tinha proposto este livro para discussão não apareceu. Mas temos fotos para mostrara que a sessão na Academia Portucalis que nos recebeu..estava cheia de leitores!

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

O Estrangeiro, Camus



O JLPeixoto não nos deixou em paz. O livro que escolhemos para o debate do mês seguinte por sugestão do Aggio, foi "O Estrangeiro" de Albert Camus. Com o meu acordo incondicional, já que era um dos livros da minha vida.
Talvez por isso...e para se vingar...escreveu sobre o que andava a fazer depois de ter lido certos livros franceses. ..até porque não terminámos a leitura nem o debate sobre "Uma casa na escuridão".
"Fui ver se os rapazes que jogavam à bola em frente à oficina do meu pai já tinham chegado. Fui na minha bicicleta azul. Nessa altura, a corrente saltava com muita frequência e sujava as mãos todas de óleo para voltar a colocá-la. Cada vez que acontecia, eu pensava que tinha de levá-la a alguém que a arranjasse definitivamente, a apertasse. Quando terminava de colocá-la, esquecia-me desse propósito e pensava que, desta vez iria ficar mais tempo sem saltar e, depois, quase milagre, iria arranjar-se sózinha. Os quase-milagres custam muito a acontecer...."

"Não vou dizer aquilo que fiz. tenho vergonha. Não devia ter, mas tenho. Eu tinha treze anos e estava sozinho no meu quarto. Toda a gente já fez aquilo que eu fiz naquele momento. Se alguém se levantar a dizer que não o fez, tenho pena dessa pessoa...Até podia contar aquilo que fiz depois daquilo que fiz imediatamente após concluir a leitura de "O Estrangeiro", de Camus, mas acredito que isso já não vos interesse tanto. Parece-me que gostariam de saber o que fiz logo depois de ler "O Estrangeiro", de Camus, afinal esse é o título e o pressuposto deste texto, mas isso não vou dizer."

JL Peixoto, "Verdades quase verdadeiras" in JL, 17-30 dezembro 2008

"Uma casa na escuridão" JLPeixoto


Já viste as minhas novas tatuagens? Sim,vamos ver!
Era preciso dar um salto em frente. A ideia partiu do Viktor.
Vamos ler o JLPeixoto! A escolha era ousada. Ambos tínhamos ficado perturbados com "Morreste-me".
Depois disso o JLPeixoto começou a escrever outras coisas. Na dedicatória que escreveu para a Elsa pedia-lhe algum cuidado, "esta casa de palavras que espero que lhe fale apenas de luz", Lisboa , 9 de junho de 2007.
"a minha casa que era aquele livro de lombada azul...era esse livro que tremia na minha mão...nunca soube porque escrevia."
Sabias sim...JL porque tu respiravas lombo e arroz e já não podias mais.

George Orwell "1984"

Depois de Huxley o idealista fomos buscar às prateleiras um escritor político e um pensador de importância. Mais uma vez nenhum de nós tinha livro o livro. A Hopes conhecia "Animal Farm" (O Triunfo dos porcos) e eu a "Homenagem à Catalunha".
"1984" é o big brother, um modelo de desenvolvimento, de um género familiar aos economistas e aos sociólogos, onde cada capítulo se encontra devidamente organizado, apresentado de uma forma lógica e estruturado como o "Leviathan" do Thomas Hobbes, a obra maior da filosofia política inglesa.
O regime no poder é de uma inteligência diabólica, uma síntese entre o estalinismo e o nazismo. "1984" está para o século XX como o "Leviathan" esteve para o século XVIII. Orwell vai escolher o romance e não um tratado filosófico para formular o conceito de totalitarismo e explicar que existiam elementos comuns saídos dos dois regimes supostamente antagónicos que se afrontavam na Europa.
Ele que tinha participado como combatente na famosa V Brigada dos voluntários internacionais que lutaram ao lado dos republicanos na guerra civil espanhola e conhecera de perto as guerras internas que tinham contribuído para o enfraquecimento e derrota da frente anti-franquista, nomeadamente as limpezas ideológicas que tinham levado o PCE à eliminação do POUM e dos Anarquistas.
Orwell foi aquilo que os professores de Oxford da altura classificaram de um espírito inconformista, rebelde e temerário. Apresentar as suas ideias sobre a forma de um romance teve a vantagem de atingir um maior número de leitores mas o inconveniente de lhe faltar alguma precisão e sobretudo a credibilidade dos meios académicos. Foi preciso esperar mais de 15 anos antes que Hannah Arendt publicasse "As origens do totalitarismo" (1951). Arendt não cita em nenhuma parte "1984", se bem que o livro antecipasse um bom número de conclusões a que ela chegou no seu enorme estudo.
"1984" foi talvez entendido como um testamento, quando o livro era mais do que uma profecia, uma antecipação do futuro e não apenas um terrível aviso. Mas isso seria confundir o jornalista e ensaista Eric Blair, com o escritor conhecido pelo nome de George Orwell.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Um admirável mundo novo

.
“O Admirável mundo de novo” é um famoso livro de utopia/ficção científica do escritor inglês Aldous Huxley descreve um mundo futuro (não tão admirável), onde as crianças serão concebidas e geneticamente controladas em laboratórios, em linhas de produção artificiais. Nos laboratórios são definidos os poucos dotados, destinados ao trabalho braçal, e também os que crescem para comandar. As castas sociais são pré-definidas para alimentar o slogan "comunidade, identidade e estabilidade". Não há espaço para a supresa, para o imprevisto. Admirável Mundo Novo retrata a sociedade imaginada por Huxley, onde todos seriam de todos, felizes e perfeitos...

O mundo novo é mesmo admirável? Tinhamos mesmo que perguntar... Qual, o lugar do homem, numa sociedade dominada pela máquina? Qual, o caminho para o Indivíduo que reivindique a liberdade interior e o direito à sua individualidade, à sua singularidade? Se «Cada um pertence a todos» (p. 37), qual o objectivo? Não será uma forma de controlo?


Até nos imaginamos a tomar SOMA, o célebre remédio do Mundo Novo para aliviar a depressão, frustração, solidão e dúvidas. Qualquer fuga da realidade patrocinada pelo Estado é mais prática e fácil que a resolução definitiva do problema. E percebemos qual é a Soma na nossa sociedade. Consumismo, prazer imediato, conformismo, controlo das massas pelos média... não andamos também anestesiados?

O livro fala de condicionamento do comportamento e da clonagem. Argumento após argumento, verificámos que funcionamos também como clones, achamos normal a violência, fome, guerras, miséria, inflação, corrupção. Se alguém escapa às convenções sociais é olhado de lado, arrogante e ignorante. Quase se ouvem os altifalantes a dizer: "Ser diferente é incorrecto, faça o que a maioria faz e seja feliz".

E foi assim, de uma conversa sobre "Um admirável Mundo Novo", surgiram muitas reflexões e opiniões sobre um mundo bem real... o nosso!

E para que serve o Blog?

.
Com as nossas sessões no Second Life, cada vez mais concorridas e animadas, fica-se com a sensação que ficou algo por dizer. Houve quem quisesse acrescentar mais qualquer coisa, mas entretanto outro tópico surgiu. O blog permite que essas questões não fiquem no vazio. Convidamos os nossos leitores a comentar, a colaborar como co-autores e a tirar partido deste espaço, que se pretende seja de todos.

Vamos aproveitar, para dar a conhecer aquem não esteve connosco desde o ínicio, o que se falou e o que esteve em debate em anteriores sessões. E claro, vamos preparar novos encontros e novas discussões. Pretende-se sobretudo preservar momentos, palavras ou imagens que marcaram o City Lights.

Se a ideia é preservar momentos, esta foto do nosso último encontro é certamente para recordar:



Obrigado ao Imso por ter captado este magnífico plano e por ter cedido a foto!


domingo, 4 de janeiro de 2009

E este é o City Lights...

.
Tudo começou com uma simples conversa. Porque não se fala de livros no SL? Há espaço para tanta coisa... Um livro é um pretexto para falar de tanta coisa. Um grupo de leitura, porque não? A vantagem de estar no Second Life, é que não precisamos de financiamento, de um espaço físico, bastam as nossas ideias e quem nos queira ouvir. E será que alguém nos vai querer ouvir? Estamos a competir com discotecas... E se ninguém aparece? Não faz mal. Se ninguém aparecer, falamos nós do livro. Claro... Tentar não custa. Escolhemos um livro. Criamos um grupo. Um nome. "City Lights" soa bem, afinal tiveram a mesma ideia que nós... Sim "City Lights".

O livro? Porque não "O Admirável Mundo Novo" do Aldous Huxley? Alguém sugeriu... É um clássico, e eu nunca li. Nem eu. Vamos ler agora. E vamos ter muito que falar... Claro. Divulgamos o evento. Vieram seis pessoas, nada mau para começar. E muitas palavras vieram com elas. Outras sessões vieram, outros livros. Menos pessoas, duas vezes, três vezes... Vamos desistir? Não! As pessoas não gostam de cultura, não lêem. Há coisas mais interessantes para fazer. E para debater, é preciso pensar... dá trabalho! Vamos desistir? Não!

Continuamos. As pessoas vieram. As discussões eram animadas. Superavam expectativas. As nossas, as dos nossos leitores... Há quem não falte! Ena estiveram vinte pessoas... Acreditavas que seria possível? Não, nunca pensei... Vamos levar as nossas conversas para fora do SL? Um blog era boa ideia! Sim, há muita coisa para dizer que não deve ficar limitada a duas horas num mundo virtual... Claro... Um blog!